domingo, outubro 25

Em caso de falta de incêndio, acorde o dragão.


Desejar algo tal como é, é um gesto infinitamente belo. Querer ultrapassar a espessa linha entre o eu e o outro para que talvez algo em algum momento se funda é de uma audácia e prepotência admiráveis. A partir daí, dessa faísca de isqueiro prematura que pela falta do gás foi incapaz de iniciar o fogo, a partir deste momento onde um ser olha outro ser e pensa que talvez a solitária geografia do corpo possa ser transposta, algo acontece. E o som da roda metálica que fez a faísca se propaga no ar desencadeando algum percurso de eventos imperceptíveis para os olhos assustados de quem não sabe o que fazer com uma vontade insatisfeita. Há de se ter fé em qualquer coisa e resistir à tentação de girar a roda de fricção da faísca mais e mais vezes, como se o efeito sonoro não tivesse reverberado da vez primeira. É que as coisas têm uma medida de esforço precisa para que aconteçam na sua plena potencialidade e ela é o gesto involuntário bruto de se desejar algo tal como é. Moção à primeira vista. Se nada aconteceu, a roda girou errante, o que pela ironia da vida ou pela importância do tropeço, também acontece. Há de se evitar o erro da reiteração pois ela é um solvente. A teimosia tem um passo torto que pega o máximo de impulso e anda pra trás. Tem uma linha que é muito sutil entre desejar algo porque sim e desejar algo por quê não? Intuição. Invenção. O dilema de quem deseja alguém que parece ter tanto a ver que não faz o menor sentido que roda, faísca e gás ainda não tenham se unido na chama irrevogável da paixão. A ilusão é uma das maiores pedras no caminho de quem bravamente escolhe sair da intransponibilidade de si mesmo através das janelas empoeiradas dos sentidos. Este vidro só quebra com um soco de mão nua que já perdeu o medo de se machucar. Mas é grande fonte de inspiração, a ilusão. Fatalmente faíscas de chamas que não chegaram a acontecer se transformam em labaredas dracónicas na alta mente inflamável.


3 comentários:

vanessacamposrocha disse...

um fil[osofo diz que a gente só é verdadeiramente autêntico quando entra no nada!
abraços

Sérgio Luz disse...

gostei de seu blog. nessa primeira página, principalmente do "superolho". até

guru martins disse...

...muito
doido!!!

bj