terça-feira, julho 27


ando a esmo pois se
minhas pernas param,
o corpo cai para frente. mente
em alta velocidade corrente;
pende ao chão almejando o céu.
corpo em movimento.
mãos avulsas ao sabor do vento.

corro. paro. corro. penso.
pensar no caminho é meio
passo para não sair do lugar.
penso o passado e a mão
avulsa pulsa, vazia.
segurando a cabeça como
se pudesse detê-la.

que voe!

peguei na mão do tempo para
mostrar-lhe eu mesma
o caminho.
a mão cheia, comigo, lado a lado,
fica dado o recado:
tempo, serás tu meu maior aliado.

quinta-feira, julho 22

menu de quinta

a vida é amarga ponto

o segredo é ir apurando o paladar

quarta-feira, julho 21

ponto de vista (ou ponto de fuga)

aonde você olha quando anda na rua;
pra beleza das pessoas
pra feiura;
de fora pra dentro
de dentro pra fora?
em que momento elege
respirar fundo;
olhar ao redor e enquanto
inspira quantas ideias
se rearranjam em busca
de frestas na paisagem?
sustentando um tecido breve
com a força do pensamento.
pintando, ligando pontos.
estrelas suspendem o cenário e
mentem.
o novo universo faz da realidade
marionete; um títere.
contando a história da vida
encantada//amaldiçoada.
vida que pulsa, pula.
vida que escapa.

sábado, julho 17

Ping Pong

Eram duas horas quando João percebeu que sua mãe estava vindo. Naquele momento, quis pular da janela. Mas Maia entrou salão adentro gritando, pois gostava de João. Jamais quis acordar sem tê-lo. Garoa, era mais velha do que uma bruxa. Bigorna. Era tudo menos linda. As curvas de sua filha, feia, piranha, cuja malícia não contribuía em nada. Católica, Maia não pode permitir que fosse concebível traição. Era mãe demais.
Assim foi impedir a morte daquele jovem. Eu gritei. Mas ouvi outro grito além das paredes e pude determinar a merda que fizera. Acordei puto. Onde estão os ladrões? Bastardos. Malditos, poderiam matar três bodes ao acordar. Aqueles cruzeiros me fariam muito bem. Um belo dia, chutei a cara de um torto. Bêbado, quis cuspir. Maia! Que entrou pela janela separando os brigões. Num átimo de reflexo, driblei Maia e derrubei João. Falei: venham! Roubei três bodes. Acordei. Rico.

quarta-feira, julho 14

pormenores

algo insiste contra o anseio
do meu corpo por se
desintegrar neste corpo
alheio
cada um se defende -
de quê? - como pode e eu
teimo com o meio
antes de cruzar a linha
(alongando o peito e
a contagem regressiva
- a coragem decisiva)

entretanto,

a caixa preta da sua retina
tem me mostrado mais coisas
do que você imagina

entre tato

nesta conversa de olhos,
mãos, bocas mudas,
entender perde
sentido vira via de
mão dupla

entreato: canto

e se eu recuar,
você promete que avança?
é que nesta dança
dois pra lá
dois pra cá
pouco assimilo
onde se esconde o próximo passo?
- meu pé suspenso tateia o ar
sua mão vem e duplica a minha
cintilo, sigo
mesmo sem saber
começo a achar tranquilo

terça-feira, julho 13

Negócios

Que o dia a dia não faça as pessoas ficarem frias

Porque isso impacta no negócio

Porque isso prejudica

O lucro

Que o dia a dia não faça as pessoas ficarem distantes

Que faça o empregado sentir que ele tem um relacionamento

Humanizado

Que ele é um ser humano

E pra essas pessoas

A empresa é um mundo mágico

Que deu roupa pras crianças

Deu comida

Deus

O presidente é mito

Há um funcionário

Que era hippie no Rio de Janeiro

Virou empresário

Outro era retirante

Veio do Norte, começou a trabalhar

Comprou uma lojinha

Hoje, ele tem várias lojinhas

O presidente desta empresa é um mito

Pra essas pessoas simples

Que não estudaram

Que confiam que o presidente

Ah, o presidente

Tem o Silva

Que comprou uma cobertura em Copacabana

E quer que a gente vá lá tirar fotos

E bote na televisão

Como manter a marca

Com esta confiança

O que a marca faz, a rede segue

Continuação

É preciso ressaltar os valores essenciais

Pra manter o lucro

Pra manter o mito

O presidente desta empresa

Ele é esta empresa

A empresa precisa de olhos

Precisa de boca e voz firme

E suave

Mito

Minto

Deus

Ousadia é um valor que a gente está trabalhando

Sempre

Ousadia

Materializaremos o mito

Através desta peça de vídeo

Explicaremos passo a passo

Emoção a emoção

Porque este homem

É o mito desta empresa

É desejo secreto

Do presidente honorário

Se ver materializado

No sorriso do empregado


Porque não se contenta em extrair-lhe o sangue.


quinta-feira, julho 8

1.

Você falou da sua amiga que tem câncer para que todo o resto entre a gente ficasse pequeno. Mas já era pequeno. E ainda seria se ela tivesse mononucleose. Aquilo não era amor, jamais se tornaria. Sorte a nossa. Que passávamos disfarçados no meio do tiroteio.


2.

Mas a vinda do estrangeiro foi mesmo uma audácia. Aquele ser poderia não pertencer a lugar nenhum. Tinha mania de falar pouco, fazia questão de escutar. Com uma cara que quem entendia o que se estava falando, balançava a cabeça compassadamente, compulsivamente. Falso complacente. Para rir até fechava os olhos, mas estava certa de que entendia uma graça diferente da minha. Talvez risse de nós que vivíamos distraídos. Aquele estrangeiro. Tinha em si uma porta que nunca deixava entrar. Espiava o mundo de dentro daquela fechadura.

domingo, julho 4

intimidade

é o que cresce enquanto
distraídos
falamos bobagens.
essencialidades disfarçadas,
desfile de entrelinhas.
você passa e eu capisco,
pisco.
entre a pálpebra e a retina
algo alucina.
desfaz-se o celofane;
desembrulho.
barulho de chuva no peito.
vida com efeito especial.

quinta-feira, julho 1

como amar o mar, amor?


o amor não afaga,
afoga. asfixia.
é um oceano despejado
gota
a gota
na cavidade oca do peito
morto de sede. que não sabia
ser esse o mal que sofria
até que num relance;
'respingo'.
e a possibilidade da plenitude
acena de um horizonte improvável.

como se um ser pudesse se libertar
de si mesmo.

amor: torneira que pinga miséria
e vicia.
a sede é sempre maior que o mar.
caixa d'água vazia.
ainda assim, a boca sorri. cheia de sal.
como se um dia pudesse chegar
a destilar o oceano inteiro.