quinta-feira, setembro 25

Eu e o cachorro branco


Não sei se o tempo anda arrastado ou é esta a ausência de alguém que troque os dias no calendário. Sonhei com o calendário da cabeceira hoje. Era um aparato gigante que para meu desespero só contava os anos até 2011. Então este seria o último ano. Pude nadar um pouco mais entre seus ares temporais e percebi que na verdade havia outros anos, os anos seguintes, mas estavam camuflados como se fossem passado. No sonho também tinha um cachorro de rua que me seguia, ele tinha um olho só, o outro era queimado, branco, havia ficado cego. E eu não sabia se deveria ter medo do cachorro, achava que ele poderia eventualmente avançar em mim. Mas mesmo farejando meu medo, o cachorro seguiu fiel ao meu lado, atento aos perigos que pudessem cruzar nosso caminho. Dançando em poças de chuva, acompanhada pelo meu cachorro branco, cheguei até ele, que dava um depoimento qualquer para uma câmera. Sempre olhando para outro lado que não o meu, pensei. Não pude evitar atrapalhá-lo e respingar água em sua camisa enquanto colocava meus sapatos molhados aos seus pés. Então pedi desculpas e passei a mão sobre seu tórax fingindo secar os pingos d'água. Ele sempre cruza meu caminho com a mesma expressão angelical de há - talvez agora faça exatamente - dez anos. No mais, tudo bem, eu disse, dei um beijo em sua têmpora e segui viagem de pés descalços. Da próxima vez, eu prometi, não faço mais planos. Nenhuma dor é pior do que essa, o amor abortado. O eco daquilo que não chegamos a ser, esta tormenta nos meus tímpanos.

terça-feira, setembro 16

inabsorção


ouço vozes
flutuando ao redor da cabeça
compondo cenários musicais 
enquanto mergulho em mim
vou ao fundo, faço chão
me afogo até desaguar
até que as frases ganhem sentido
até que eu engula o mar