terça-feira, março 30
sexta-feira, março 26
veraneio (desvario)
me aparta
o sol quente, alto contraste
eu destacada, recortada
ao longe, o mundo
a alegria irrefreável do Rio
a morena de short
o moreno sem camisa
eu branquela de alma embotada
óculos escuros, suando em bicas
dilúvio do meu ser evidenciado
pelo verão eterno desta cidade
mal ergui as barreiras, já transbordo
água, lágrima, sal, mar morto
meu próprio rio
do qual rio
sem graça
devaneios de cachecol
para escorar o pescoço
e meias que amenizem
o desconforto de botar os pés no chão
sem escolha, ando quase nua
ardendo de calor e frio
aguardando que o inverno
me recomponha
nos limites firmes da sua indolência
terça-feira, março 16
Edgar
domingo, março 7
Guardanapo
Eu estava a ponto de dizer que ter te conhecido refratou meu sentido para um caminho que já me parecia melhor desde o primeiro dia; e que algo me dizia que um tempo de talvez felicidade estivesse a caminho. Quando sua mãe entrou na sala com duas cocas, gelada, e ligou a televisão. Era domingo, o Faustão está tão magro, eu disse. Devia mesmo ser loucura. E ficamos ali naquela posição até o Fantástico começar. O domingo acabando com aquela tristeza de um recomeço que talvez nós não quiséssemos se nos fosse dado o direito de escolha, a segunda, cada um pro seu canto. Um dia, eu ainda conversaria com você até o Altas Horas começar sobre como cada ser humano deveria ter o direito de fazer seu próprio calendário como bem entendesse. Você diria que seria impossível organizar um mundo assim e eu sorriria secretamente satisfeita com seu senso de praticidade. Como naquele dia, na mesa do bar, eu não sabia onde colocar a sacola e você sem interromper a conversa com qualquer outro tirou a sacola da minha mão e a colocou num canto. Eu me encantei, te digo agora, com seu jeito de me enxergar olhando e escutando outra pessoa, sem virar as pupilas na minha direção. Era a mim que você via com um sentido que os outros não podem ver e hoje vejo o quanto é mesmo especial, esse sentido que a gente criou, nosso canal próprio de comunicação por onde transmitimos nossas melhores piadas em forma de metonímia que os outros mortais jamais compreenderiam, o mesmo canal por onde escorremos um pelo outro. Meu amor, hoje eu te digo com muito mais propriedade, tudo que eu achei que fosse brega em algum momento da minha vida hoje com você me toma de um jeito vanguardista. Quero que você não guarde esse bilhete, que o rasgue. Porque não poderia suportar que alguém lesse tamanho segredo. Algo acontece entre a disposição dos nossos corpos materiais, a criação. Profanar nosso mundo, jamais.